Osmarino e a Venda de Madeira

Em abril de 2012, agentes do ICMBIO (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) apreenderam madeira encontrada na Colocação de Osmarino no interior da Reserva Extrativista Chico Mendes. O fato foi notícia na imprensa acreana e Osmarino foi identificado por muitos como “vendedor ilegal de madeira”. Já na época Osmarino divulgou uma nota esclarecendo os fatos.

A defesa administrativa contra uma das multas aplicadas já foi apresentada, mas ainda não foi submetida a julgamento.

Em função dessa apreensão, encontra-se aberto em Epitaciolândia, cidade vizinha a Brasiléia, um Inquérito Policial que investiga a possibilidade de Osmarino ter cometido crime ambiental. As investigações ainda não foram realizadas.

O comércio de madeira é uma das questões mais sensíveis na Amazônia. O governo do Acre alega ter conseguido combater a venda ilegal, através da regularização do manejo. A experiência acreana de “manejo sustentável”, promovida por uma série de instituições, como a ITTO e técnicos do setor florestal como o próprio Jorge Viana (ex-governador, atualmente senador e irmão do governador Tião Viana), foi um dos exemplos que fundamentaram a aprovação da Lei de Gestão de Florestas Públicas, com o apoio de Marina Silva em sua gestão no Ministério do Meio Ambiente. Não há nada mais polêmico no estado do Acre do que o tal manejo sustentável, ao qual as críticas nunca são toleradas. São muito grandes os interesses envolvidos.

E quem sempre foi um dos principais críticos do manejo madeireiro? Osmarino Amâncio Rodrigues! Abaixo, trechos de entrevistas concedidas por Osmarino a duas pesquisadoras para seus trabalhos de pós-graduação, que comprovam esse posicionamento crítico:

A ideia da construção de um pólo moveleiro, apoiada por uma parte significativa do governo estadual do PT (o governador do Acre, a Senadora Marina Silva, o Deputado Estadual Ronald Polanco e o Prefeito de Xapuri, Julio Barbosa de Aquino), foi discutida e rejeitada pelos STRs de Xapuri, Brasiléia e Assis Brasil. Não conseguindo o aval dos trabalhadores, a Prefeitura de Xapuri resolveu assumir a construção do pólo em parceria com a central sindical italiana CGIL, que entre outras coisas tem se encarregado da formação profissional, e da prefeitura de Como, que fez a doação de uma marcenaria completa. (…) O projeto do pólo moveleiro foi apresentado à CGIL pelo Deputado Polanco, segundo Osmarino Amâncio Rodrigues, uma das antigas lideranças do movimento de seringueiros. Em entrevista, ele manifestou sua preocupação com esse projeto e declarou, que em meados de 1999 quando esteve na Itália, alertou a CGIL de que esse projeto não estava levando em consideração a resolução do IV Encontro de Seringueiros ocorrido em Brasília em 1995, quando a maioria da base se manifestou contrária à retirada de madeira, inclusive ele e lideranças de peso do movimento acreano (…). Além do risco de que entrem no manejo espécies sobre as quais ainda não há experiências de desenvolvimento em plantio, Osmarino coloca a impossibilidade de não haver prejuízos para a biodiversidade com a entrada de máquinas desmatando e arrastando a madeira e com a queda de árvores que destroem uma grande quantidade de espécies. 

(…) No que diz respeito à forma como os seringueiros se colocavam com relação à questão madeireira há dez ou quinze anos atrás, ele afirma que eles eram contra as retiradas, apesar de não terem clareza suficiente sobre as consequências. Hoje, porém, a discussão amadureceu e outros projetos são discutidos. Houve uma assimilação das ideias de líderes como Wilson Pinheiro e Chico Mendes e isso se reflete nas resistência, apesar das promessas de lucro. Ele avalia, porém, que os técnicos acabam muitas vezes deixando-os confusos e não se sabe quanto os seringueiros vão resistir sem vender a madeira, com tanta propaganda para que assimilem essa proposta. Na opinião de Osmarino todo esse projeto de desenvolvimento que tem como foco principal a madeira, se contrapõe às lutas e resistência e coloca em risco o que resta do movimento acreano”. (Grifo nosso) (ISABEL, 2001).

No plano de utilização a gente coloca que nós tínhamos de fazer o aproveitamento racional dessa região, mas uma das coisas que a gente tinha o maior cuidado era de não exportar matéria prima. Então o que que nós colocamos? […] A madeira não será vendida, nós vamos utilizar todos os produtos não madeireiros […] Era consenso […] Até o IV encontro do Conselho Nacional dos Seringueiros. No IV Encontro, chega os engenheiros florestal fazendo uma proposta do uso múltiplo, e que tava lá, do aproveitamento da madeira. O “desenvolvimento florestal”, manejo madeireiro, lá dentro. Aí começou a divergência interna no Movimento, porque a maioria do Movimento resistiu até certo ponto, nós conseguimos. Qual foi a primeira atitude deste pessoal? Trabalharam para tirar a estrutura do Conselho Nacional dos Seringueiros da Amazônia. Começaram a investir em algumas pessoas, e hoje, o que que nós assistimos a proposta dentro da Reserva? (CUNHA, 2010). (Grifo nosso). OBS: Cunha não atribui o nome de Osmarino a essa fala, mas a descrição que a autora fornece de seu enunciador deixa claro que se trata dele.

Em 2005, Osmarino foi um dos grandes críticos do Projeto de Lei de Gestão de Florestas Públicas, pois tem consciência de que o principal produto do “manejo múltiplo” é sempre o mais rentável: a madeira. Nessa época, fez repercutir, com outras pessoas, críticas ao “projeto modelo” implementado na Floresta Estadual do Antimary”. Os videos abaixo são dessa época:

A reação às críticas feitas por Osmarino foi muito forte, com direito a alguns ataques pessoais, e resultou em uma grande demonstração de “peleguismo” da CUT e CNS. O mesmo ocorreu no ano passado, quando novas denúncias de irregularidades na Floresta do Antimary, assim como em outras áreas manejadas por empresas com certificação FSC (o selo verde da madeira) – divulgadas na Carta do Acre (também subscrita por Osmarino, acompanhando outras pessoas e organizações) – foram rechaçadas pela máquina de propaganda dos manejadores de madeira. Parece haver um modus operandi já estabelecido para essas defesas: qualquer crítica é mero “oposicionismo”, traição e, até mesmo, falta de amor ao Acre.

Assim, não restam dúvidas de que Osmarino não é o grande vendedor de madeira da Amazônia. Criminoso ambiental? Destruidor da floresta? Sob a perspectiva de um ambientalismo elitista e anti-humanista, a população pobre da Amazônia, que caça, pesca e faz roçado é o inimigo a ser combatido. Mas, não nos enganemos: o maior destruidor da natureza é o capital, em sua ânsia de expansão. Sob seu controle, não há manejo, nem desenvolvimento, nem coisa alguma que possa receber o rótulo de SUSTENTÁVEL.

 Não à criminalização da pobreza, das lutas e dos movimentos sociais.

Referências:

CUNHA, C. C. Reservas Extrativistas: Institucionalização e Implementação no Estado Brasileiro dos anos 1990. Tese de Doutorado em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social (Programa EICOS). Instituto de Psicologia, UFRJ, 2010.

ISABEL, R. M. R. S. Acre: das Lutas Socioambientais ao Desafio de um Desenvolvimento Sustentável. Dissertação. Mestrado em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade. Instituto de Ciências Humanas e Sociais. UFRRJ, 2001.

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